A (Im)Possibilidade de Fechamento de Áreas Comuns dos Condomínios pelo Síndico diante da Pandemia do Coronavírus e os seus Impactos
Thays Adriana Sagas do Prado[1]
Liliane Vinadé Silva[2]
Resumo: O presente trabalho tem o intuito de verificar a (im)possibilidade de fechamento das áreas comuns do condomínio pelo síndico diante da pandemia do coronavírus, verificando as limitações ou não do Direito de Propriedade, bem como os impactos que os empreendimentos estão tendo em decorrência da pandemia.
Palavras-chave: Condomínios. Áreas Comuns. Fechamento. Síndico. Coronavírus.
Sumário: Introdução. 1 A (Im)Possibilidade de Fechamento de Áreas Comuns Diretamente pelo Síndico. 2 Impactos da Pandemia da Covid-19 nos Condomínios. Conclusão. Referências Bibliográficas.
Introdução
A pandemia mundial do novo coronavírus alastrou-se por quase todo o planeta, causando prejuízos imensuráveis em todas as esferas, como a política, a econômica e a social.
A característica condominial tornou-se parte essencial para discussão entre os estudiosos do tema, em decorrência da grande possibilidade de propagação do COVID-19 em um ambiente que se tornou tão frágil, o lar.
Para tanto, surgiram discussões sobre a possibilidade de fechamento das áreas comuns dos condomínios, bem como a autonomia do síndico em fazê-las sem que houvesse a aprovação de uma assembleia.
Desse modo, o objetivo do presente artigo é explorar as nuances do tema e apresentar possíveis soluções a esses questionamentos.
1 A (Im)Possibilidade de Fechamento de Áreas Comuns Diretamente pelo Síndico
A Organização Mundial da Saúde (OMS), no dia 11 de março de 2020, decretou estado de pandemia diante da disseminação em massa, por diversos continentes, do novo coronavírus que assolou o mundo, causando a doença conhecida como COVID-19[3].
É evidente que existem diversas microssociedades que têm de tomar decisões para garantir que a pandemia não chegue até o seu ambiente, a fim de que não haja propagação da doença.
Nos condomínios não está sendo diferente. Os síndicos têm adotado diversas medidas de distanciamento social, dentre as quais o fechamento das áreas comuns do empreendimento e até mesmo o impedimento do ingresso de terceiros nos condomínios. Entende-se, como exemplos de áreas comuns, salões de festa, academias, espaços kids e teens, entre outros.
Qualquer que seja o ato, além da necessidade de observar os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, também necessariamente deve ser submetido à assembleia condominial.
O Código Civil, em seu art. 1.348, dispõe, entre outras funções, que cabe ao síndico representar o condomínio, praticando atos necessários à defesa e aos interesses comuns; comunicar imediatamente à assembleia qualquer ato de interesse do condomínio; bem como diligenciar na conservação e guarda das partes comuns, zelando pela prestação dos serviços que interessem aos condôminos.
Desse modo, verifica-se o dever do síndico de informar aos condôminos a obrigação que cada um deles possui, zelando pelo seu sossego, salubridade e segurança, conforme dispõe o art. 1.336, inciso IV, do mesmo Códex. Ainda, é importante mencionar que tais obrigações acabam por refletir no âmbito penal[4].
Resta ao síndico, então, preservar a saúde e a segurança de seus condôminos, tomando as medidas que entender mais adequadas, mas que devem ser posteriormente ratificadas em assembleia designada com edital específico para tal discussão.
Nos casos em que o emprego desse método não for possível, o síndico – junto aos demais integrantes da gestão condominial – deve estabelecer, com razoabilidade e proporcionalidade, as restrições ao uso de cada área comum para evitar aglomerações e eventualmente a disseminação do vírus nas dependências do condomínio, a fim de resguardar e preservar a saúde de seus condôminos.
Imperioso destacar que eventuais excessos praticados pelo síndico, gestor e/ou condômino poderão (e deverão) ser averiguados diante da realidade social naquele condomínio.
O grande questionamento que se faz é se tais decisões do síndico não afrontariam o Direito de Propriedade dos condôminos.
Em que pese o Direito de Propriedade estar garantido na Constituição Federal, tal Direito não deve ser sobreposto ao da coletividade, bem como sempre deve ser objetivada a segurança e a saúde de todos os condôminos, podendo o síndico, juntamente com o seu corpo diretivo, tomar as medidas que entender cabíveis para garanti-las, ratificando-as, posteriormente, quando possível, em assembleia designada para tal ato, como explicado anteriormente.
Portanto, pode-se concluir, nesse ponto, que o Direito de Propriedade dos condôminos não estaria sendo violado, desde que as limitações sejam aplicadas de forma a garantir a saúde e segurança destes, sem abusar da razoabilidade e da proporcionalidade.
2 Impactos da Pandemia da Covid-19 nos Condomínios
Feita a análise jurídica da (im)possibilidade de fechamento das áreas comuns do condomínio, passa-se à discussão de determinadas situações concretas de impactos causados pela pandemia da COVID-19.
A primeira questão é em relação à notícia de pessoa infectada pelo vírus no condomínio. Caso não se tenha notícia, atendidas as situações já colocadas anteriormente, o Condomínio poderia simplesmente restringir o uso ou até fechar algumas (ou todas) áreas comuns. Porém, se houver algum caso no condomínio, medidas ainda mais restritivas poderão ser tomadas pelo gestor, sem que isso implique – necessariamente – em afronta ao Direito de Propriedade.
De outro norte, existem questões um tanto quanto controversas, que num primeiro momento podem não gerar consenso entre as partes, o que leva o condômino a buscar solução no Poder Judiciário.
Um exemplo de tal situação ocorreu na Capital Catarinense, quando os proprietários de um apartamento buscaram o judiciário com o intuito de concluir a reforma em seu imóvel, suspensa em 18 de março por força de decreto estadual. Em que pese ao Governador do Estado de Santa Catarina ter autorizado posteriormente o retorno das atividades de construção civil, o síndico do referido condomínio não permitiu que a obra continuasse. O juiz, por sua vez, negou a liminar, argumentando em síntese que “o foco deve ser a proteção e a integridade de todos os moradores”[5].
Em outra decisão, foi permitida que uma inquilina tivesse livre acesso, de forma imediata, à unidade condominial para retirar seus pertences e objetos pessoais, inclusive com ajuda de terceiros, para realizar sua mudança. Por oportuno, salientou que a retirada dos seus bens obedecesse os horários permitidos em convenção de condomínio e as regras de higiene e sanitárias, evitando, assim, a disseminação do COVID-19[6].
Com efeito, como se denota, podem ser tomadas também medidas de cunho não extremamente restritivo, porém preventivo, como: utilização escalonada dos espaços comuns, observância e respeito ao distanciamento mínimo entre pessoas, não compartilhamento de objetos pessoais e adoção de medidas de higienização em áreas comuns (dispenser contendo álcool em gel, por exemplo).
Tem-se percebido, em época de pandemia do coronavírus, especialmente no que tange aos operadores envolvidos na solução das controvérsias, que a melhor forma de resolver a questão é fazendo uso da autocomposição e mediação, já que o Poder Judiciário terá ainda mais dificuldades para analisar pormenorizadamente os casos envolvendo litígios condominiais em uma época pós-pandemia.
Conclusão
Denota-se das considerações apontadas que a existe a possibilidade, por parte do síndico ou administrador, de fechamento das áreas comuns do condomínio em razão do isolamento social proporcionado pela pandemia do novo coronavírus, sem que isso incorra em afronta ao Direito de Propriedade dos condôminos.
Para tanto, os síndicos, administradores e/ou gestores deverão tomar as atitudes norteados pelo Código Civil, Constituição Federal e demais normativas legais, em consonância com diretivas da Organização Mundial da Saúde, levando todos os atos a posterior assembleia extraordinária com este fim específico.
Finalmente, a melhor forma de resolver as questões é a de não priorizar a judicialização do conflito, e sim optar pelos meios alternativos de resolução, quais sejam a autocomposição e mediação, já que o Poder Judiciário estará abarrotado de conflitos nos quais não se terá regra definida e nem precedentes adequados para o deslinde da questão.
Referências Bibliográficas
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA. Juízo do Juizado Especial Cível do Norte da Ilha. Ação de obrigação de fazer e de indenização por danos morais com pedido liminar. Processo n. 5003619-30.2020.8.24.0090, instaurado 10 de abril de 2020.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA. Justiça nega pedido de morador de condomínio que queria concluir obra durante a pandemia. Disponível em: https://www.tjsc.jus.br/web/imprensa/-/justica-da-capital-nega-pedido-de-morador-de-condominio-que-queria-concluir-obra-durante-a-pandemia?inheritRedirect=true. Acesso em: 16 abr. 2020.
WORLD HEALTH ORGANIZATION. Tedros Adhanom Ghebreyesus. WHO Director-General’s opening remarks at the media briefing on COVID-19 – 11 March 2020. Disponível em https://www.who.int/dg/speeches/detail/who-director-general-s-opening-remarks-at-the-media-briefing-on-covid-19—11-march-2020. Acesso em 15 abr. 2020.
[1] Advogada. Bacharel em Direito pela UNISUL. Especialista em Direito Tributário e em Direito Imobiliário, Urbanístico, Notarial e Registral. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário – IBRADIM; Coordenadora da Subcomissão de Direito Condominial da OAB/SC; Membro efetivo da Comissão de Direito Imobiliário da OAB/SC.
[2] Advogada. Bacharel em Direito pelo CESUSC. Especialista em Direito Processual Civil e em Direito Público. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário. Membro efetivo da Comissão de Direito Imobiliário da OAB/SC.
[3] WORLD HEALTH ORGANIZATION. Tedros Adhanom Ghebreyesus. WHO Director-General’s opening remarks at the media briefing on COVID-19 – 11 March 2020. Disponível em https://www.who.int/dg/speeches/detail/who-director-general-s-opening-remarks-at-the-media-briefing-on-covid-19—11-march-2020. Acesso em 15 abr. 2020.
[4] Art. 267. Causar epidemia, mediante a propagação de germes patogênicos.
1º. Se do fato resulta morte, a pena é aplicada em dobro.
2º. No caso de culpa, a pena é de detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos, ou, se resulta morte, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos.
Art. 268. Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa:
Pena – detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, e multa.
Parágrafo único. A pena é aumentada de um terço, se o agente é funcionário da saúde pública ou exerce a profissão de médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro.
[5] TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA. Justiça nega pedido de morador de condomínio que queria concluir obra durante a pandemia. Disponível em: https://www.tjsc.jus.br/web/imprensa/-/justica-da-capital-nega-pedido-de-morador-de-condominio-que-queria-concluir-obra-durante-a-pandemia?inheritRedirect=true. Acesso em: 16 abr. 2020.
[6] TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA. Juízo do Juizado Especial Cível do Norte da Ilha. Ação de obrigação de fazer e de indenização por danos morais com pedido liminar. Processo n. 5003619-30.2020.8.24.0090, instaurado 10 de abril de 2020.